História
De Capela á Paróquia
Os primórdios da capela
Para se entender a história da criação da Paróquia Nossa Senhora das Vitórias, em Mauá, temos de recuperar um pouco a trajetória da implantação da estrutura eclesiástica oficial na região do ABC. Nessa perspectiva, devemos destacar inicialmente a criação, em 22 de julho de 1954, da Diocese de Santo André. Pois, a partir de então, todas diretrizes e práticas católicas estabelecidas pela diocese, que foi desmembrada da Arquidiocese de São Paulo, pelo Papa, passaram a ser coordenadas por D. Jorge Marcos de oliveira, nomeado em 12 de agosto de 1954, primeiro bispo na região.
D. Jorge Marcos de Oliveira nascido em 10 de novembro de 1915, no Rio de Janeiro e falecido em 28 de maio de 1989, concluiu seus estudos seminaristas em São Paulo, no Seminário Central da Imaculada Conceição. Ordenado Padre em dezembro de 1940 tornou-se Bispo auxiliar do Rio de Janeiro, seis anos mais tarde.
Com o lema Tudo em cristo, sua atuação episcopal caracterizou-se pela aproximação da igreja com os movimentos populares, em especial a causa dos operários, empregados no maior parque industrial do país. Entre tantas iniciativas, fundou, em 1956, a Associação Lar Menino Jesus.
Por tudo isso, ainda hoje, o trabalho de D. Jorge a frente da Diocese é considerado um marco pela Igreja. Basta citarmos, por exemplo, que seus princípios filosóficos cristão, aplicados à realidade social concreta e cotidiana da região, confirmados pelo próprio Concílio Vaticano II, permanecem presentes nos debates teológicos no Conselho Nacional dos Bispos do Brasil.
Em 1975, entretanto, D. Jorge renunciou ao Bispado, atuando como Vigário na Paróquia São José, situada na Vila Assis Brasil, em Mauá. A partir de então, a Diocese de Santo André, conduzida atualmente por D. Nelson Westrupp, scj, foi dirigida respectivamente por D. Claudio Hummes (1975-1996) e D. Décio Pereira (1997-2003).
Seja como for, o fato é que a penetração da Igreja Católica, na região, de forma organizada e profícua ocorreu rapidamente, após a criação da Diocese de Santo André. Em Mauá, por exemplo, depois da instituição, em 29 de maio de 1954, da Igreja Imaculada Conceição, cuja direção foi entregue ao Monsenhor Alexandre Arminas, foram fundadas, cronologicamente, as seguintes Paróquias:
São Jorge, no Zaíra, em 28 de fevereiro de 1962, atualmente denominada São Paulo Apóstolo;
São Pedro Apóstolo, na Vila Guarani, em 19 de março de 1962;
Nossa Senhora das Vitórias, na Vila Nossa Senhora das Vitórias, em 15 de agosto de 1966;
São Vicente de Paula, no Parque São Vicente, em 07 de outubro de 1969;
Paróquia São Felipe Apóstolo, no Parque das Américas 1º de junho de 1971.
A esta altura, consideramos importante transcrever o decreto de D. Jorge Marcos de Oliveira, instituindo a Paróquia Nossa Senhora das Vitórias.
Fazemos saber que exigindo o aumento da população de Nossa Diocese de novos centros de vida espiritual que são as Paróquias, a fim de possam fiéis freqüentar a respectiva Igreja, para nela receberem os Sacramento e assistirem os divinos ofícios deliberamos, depois de ouvir os Nossos Consultores Diocesanos e ouvir as partes interessadas, usando de Nossa jurisdição ordinária, de acordo com o C.D.C e tendo em vista os cânones 1426 e 1427.
Havendo por bem, criar e canonicamente erigir, como pelo presente Decreto o fazemos a Paróquia amavivel de NOSSA SENHORA DAS VITÓRIAS, na Vila Nossa Senhora das Vitórias, em Mauá.
A nova Paróquia ficará sujeita à jurisdição e cuidado do Pároco que para ela for nomeado e dos que canonicamente lhes sucederem no cargo.
Mandamos aos habitantes da referida Paróquia que tanto para o Reverendíssimo Pároco, como para a fábrica da igreja contribuam generosamente com os emolumentos e ablações que lhes sejam devidamente devidos pelo direito, pelos Estatutos, leis e costumes de Nossa Diocese.
Ordenamos, outrossim, que funcione o Pároco e seus legítimos sucessores na Igreja de Nossa Senhora das Vitórias na Vila Nossa Senhora das Vitórias em Mauá. Esta Igreja por isso gozará todos os privilégios, insígnias, honras e distinções que em direito lhe couberem como igreja paroquial, À dita igreja concedemos pleno direito e faculdade para ter Sacrário em que se conserve o Santíssimo Sacramento com o necessário decoro e decência, bem como a faculdade de nela estabelecer-se o Batistério e a Pia Batismal, ter os livros de Tombo, de assentamento de batismo e de casamento, rubricados, abertos e encerrados em Nossa Cúria Diocesana depois de completo; e ainda lhe concedemos todas as demais honras, insígnias e distinções de igreja Paroquial.
Portanto damos por erigida e constituída em Nossa Diocese a Nova Paróquia de Nossa Senhora das Vitórias na Vila Nossa Senhora das Vitórias em Mauá. O seu titular e padroeiro será Nossa Senhora das Vitórias cuja festa se há de celebrar anualmente com pompa e religioso esplendor.
Mandamos, outrossim, que seja lido este Nosso decreto num domingo à estação da Missa paroquial na referida igreja e nas paróquias limítrofes, como também deve ser o mesmo transcrito no livro do Tombo da Paróquia e registrado no livro de criação de Paróquias de Nossa Diocese.
Os limites da nova Paróquia de Nossa Senhora das Vitórias na Vila Nossa Senhora das Vitórias em Mauá irão a Decreto a parte quando forem definitivamente estabelecidos.
Dado e passado em Nossa Cúria Diocesana de Santo André sob o Sinal e Selo de Nossa Senhora da Assunção.
Criada a paróquia, os limites de abrangência eclesiástica da Igreja Nossa Senhora das Vitórias foram estabelecidos em reunião no escritório da Igreja Imaculada Conceição, matriz de Mauá. Na ocasião, Monsenhor Alexandre Arminas e o Cônego Belisário definiram as seguintes demarcações limítrofes:
“Começa na Avenida Capitão João com a Avenida da Saudade, sobe por esta até a rua 11 de junho, prossegue por esta até a Avenida Portugal (Av. Marginal – Córrego), entre pela esquerda até a Rua Marne, atravessa a faixa da Ligth, pela Avenida Dom José Gaspar, entra na Rua Três e segue por esta até a Rua Vinte e Quatro, virando à esquerda continua pela Vinte e sete e por esta até a Av. Papa João XXIII, limite da propriedade I.R.F. Matarazzo, segue pelo limite até a divisa com o Município de Ribeirão Pires, à esquerda prossegue por esta divisa até a Estrada de Ferro – Santos – Jundiaí – por esta até o ponto d partida da Avenida da Saudada”.
As missas campais e as atividades no barracão
São denominadas Missas campais os atos litúrgicos celebrados em áreas pertencentes à Paróquia, tanto em terrenos próximos às residências de fiéis, envolvidos com a edificação do prédio eclesiástico, quanto nas dependências das indústrias, destinadas aos operários ou, ainda, por ocasião de datas significativas do calendário católico.
Vale lembrar que essas solenidades religiosas eram frequentes e ocorreram em diferentes localidades da cidade de Mauá, ao longo do século passado, nos bairros onde a comunidade católica já estava organizada, porém, não contava com a sua própria paróquia. Sendo capela, portanto não possuindo casa paroquial, essas missas eram celebradas por padres indicados pela Matriz de Mauá, com anuência da Diocese de Santo André.
Entre tantos celebraram missas capais em Mauá, o próprio Bispo Diocesano D. Jorge Marcos de Oliveira, Monsenhor Alexandre Arminas e Cônego Belisário, então responsáveis por toda organização eclesiástica da cidade.
Deve-se destacar, entretanto, que os objetivos dessas autoridades eram, dentre outros, a organização do rebanho cristão e a propagação da fé, além da mobilização da comunidade para a construção da igreja local. Naturalmente, esses acontecimentos religiosos proporcionavam um momento ímpar de convívio entre fiéis locais e as autoridades eclesiásticas.
Na vila Nossa Senhora das Vitórias não foi diferente. Ao longo dos anos inúmeras missas foram celebradas antes da edificação da Capela. Porém, os mais antigos moradores entrevistados apontam a missa celebrada para o lançamento da pedra fundamental da construção da Igreja, em 1964, como a mais significativa em suas memórias. Na ocasião, sob-responsabilidade do monsenhor Alexandre Arminas, estão pároco na Igreja matriz, foram difundidos os princípios cristãos, além de animar a comunidade para a concretização do sonho de construção da capela.
De fato, esse acontecimento contribuiu decisivamente para a organização da comunidade em prol da construção da capela no bairro. Com tais propósitos, a comunidade voluntariamente envolveu-se de copo e alma em inúmeras tarefas. Os homens executaram, de acordo comas possibilidades e conhecimentos, os ofícios de pedreiro, carpinteiro, ajudante gerais, marceneiros, entre outros. Já, as mulheres, desempenharam os afazeres para a arrecadação de fundos, fosse na organização de festas e celebrações religiosas, fosse através da preparação e comercialização de alimentos.
A crônica desses esforços da comunidade, assim como o resultado das suas ações, está registrado no Livro de Tombo da Paróquia Nossa Senhora das Vitórias. O capítulo intitulado Pequeno histórico revela que, entre abril e agosto de 1966, “após anos de luta a comissão pró-construção conseguiu realizar a construção do futuro salão paroquial e fez, outrossim, uma casa paroquial”. Também, menciona a conclusão dos trabalhos de edificação do salão, destinados para a cozinha, estúdio e eventos, entre outras atividades, além de dois banheiros públicos.
Ainda de acordo com esta fonte documental, com os recursos provenientes das quermesses e demais eventos sociais, foi possível a conclusão dos trabalhos de reboco interno e externo, além da iluminação da igreja.
Entre as várias celebrações litúrgicas aludidas, esse manuscrito destaca a de quatorze de agosto de 1966. Na ocasião, presidida pelo Cônego Plínio G. de Freitas foram fundadas oficialmente, as seguintes irmandades na Paróquia Nossa Senhora das Vitórias: Liga Católica Jesus Maria José, Congregação mariana, Pia União das Filhas de Maria e o Apostolado da Oração. Em seguida, ocorreu a procissão em louvor à Nossa Senhora das Vitórias coma imagem doada pela família de D. Irene Saturnino de Paula, hoje exposta no interior da igreja. À chegada da procissão, Monsenhor Alexandre Venâncio Arminas celebrou a missa, acompanhado do Coral e da banda Imaculada
Conceição dos Marianos, da Igreja matriz de Mauá.
Naquele dia, ainda ocorreram, no período noturno, marcantes atividades festivas e culturais, como a apresentação de um grupo de Cururu, isto é, quatro repentistas desafiando-se em prosa e verso, muito comum naquela época, além da tradicional quermesse e do concorrido leilão.
Na verdade todos esses eventos ocorriam no barracão inicialmente construído de madeira, adquirida nas Indústrias Matarazzo, localizadas no Sertãozinho e coberto de sapé. Com o tempo, além de acondicionar todo material destinado à construção da futura Igreja, esse foi o palco dos primeiros encontros litúrgicos, após a criação da Paróquia Nossa Senhora das Vitórias. Nele foram realizadas, entre outras celebrações da vida eclesial local missas, catequese e comunhão.
Ali também, ao longo das décadas de 1960, 1970 e 1980, período em que foi reconstruído em alvenaria, tornou-se o principal ponto de referência no bairro, onde foi possível a organização e execução de inúmeros projetos pastorais, educacionais, sociais e políticos, indicativos dos novos tempos litúrgicos.
Já com o intuito de capacitar profissionalmente as mulheres da comunidade foi fundado, no início da década de 1970, o clube de mães. Dirigido por Carlota Fioravanti, esse trabalho social oferecia no barracão aulas de corte-costura, pintura, crochê e tricô. Os resultados dessas ações também foram registrados no livro tombo da paróquia. De acordo com o manuscrito, no dia 18 de dezembro de 1976, “o Clube de Mães organizou o desfile de modas exibindo na passarela os vestidos confeccionados pelas alunas de corte e costura. Estiveram presentes o Sr. Prefeito Amaury Fioravanti e a primeira dama, responsável pelo curso”.
No âmbito político, entretanto, os moradores mais antigos apontam a presença nas dependências do barracão de vários ex-prefeitos, e membros do legislativo, participando de reuniões coma comunidade e ouvindo suas reivindicações. Sobre esta questão é interessante observarmos que a Igreja, apartidária, mas comprometida com as aspirações da comunidade, cumpria o papel tanto ao aplicar os ensinamentos do evangelho à realidade social, quanto ao organizar os fiéis para as discussões democráticas no processo de alternância de poder.